Magistrado doa livros e é homenageado pela Biblioteca Municipal

O desembargador Dimas Fonseca recebeu homenagem da administração da Biblioteca Municipal Francisco Meirelles. Além de ter atuado na mais alta Corte do estado...

Publicada em 09 de October de 2014 às 17:30:00

Participaram da solenidade, representantes da cultura, magistrados e a banda musical do Exército que comandou a abertura da cerimônia. Dimas é autor dos livros “Discursos e Outras Contravenções” de 1983 que trata sobre os primeiros versos escritos pelo associado; “Minha Vida em Quatro Estações” datado de 2000, no qual o autor escreve uma autobiografia em cinco estados que viveu (Piauí, Maranhão, Minas Gerais, Distrito Federal e Rondônia); “Cantos da Terra e do Infinito” trazendo a segunda obra poética do escritor em 2005; “Entre o Peso da Toga e o Canto da Lira” de 2001; “O Crime de Giletilândia” baseado em fatos reais de um processo criminal no Nordeste e depois transformado em peça teatral pelo escritor em 2007, a biografia do pai Manoel Ribeiro da Fonseca comerciante no Piauí conhecido como “Seu Beija” e a prosa “Gonçalves Dias: Amor e Morte”, no qual Dimas narra vida, paixão e morte do escritor maranhense Gonçalves Dias.


Ao todo o desembargador escreveu sete obras, doou 710 livros da biblioteca pessoal do qual 500 foram entregues à Escola da Magistratura de Rondônia (Emeron), recebidos pelo diretor da escola, desembargador Sansão Saldanha. Outros 150 livros foram doados para Academia Rondoniense de Letras e 60 para a Biblioteca Municipal Francisco Meirelles. “Esses livros me serviram pela vida inteira e eu comprei com sacrifício porque eu não podia. Eles me seguiram na minha longa caminhada”, afirma o doador.


A administradora da Biblioteca Francisco Meirelles, Lucileyde Feitosa, descreve o desembargador Dimas Fonseca como, “uma pessoa que faz parte da história de Rondônia e colaborou muito com a população. O fato de ter se sensibilizado em doar esses livros para a biblioteca vai enriquecer muito o acervo da Sala Amazônica, voltada a literatura regional”, comemora. O diretor da biblioteca Adson Muniz acredita que, “mesmo a biblioteca tendo apoio do município, ela precisa também do apoio da sociedade e dos escritores do estado. O desembargador Dimas é mais um dos escritores que contribui com esse espaço cultural”, avalia.


Convidada especial para prestigiar a homenagem ao escritor, a professora Glória Valadares – primeira diretora da Biblioteca Municipal Francisco Meirelles - foi uma das maiores incentivadoras para que o desembargador Dimas Fonseca publicasse as próprias obras “é importante que qualquer pessoa que tenha livros para doar à biblioteca deve fazer isso porque a biblioteca sempre precisa desses livros”, analisou a ex-diretora.


O presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Rondônia (Ameron), Francisco Borges, acredita que a inciativa de doar livros para espaços públicos como a biblioteca reforça momentos em que o Judiciário se aproxima da comunidade. “É um enriquecimento muito grande para nossa cidade, que um poeta nosso do Judiciário rondoniense, fazendo essa doação de obras escritas por ele mesmo e outras da própria coleção só vai enriquecer o acervo que fica a disposição da nossa sociedade”, destacou o juiz Francisco Borges.


Dimas anunciou que no final do ano vai lançar mais uma obra, com o nome “Derradeiros Cantos”. De acordo com o autor o livro está praticamente pronto e até dezembro será encaminhado para a gráfica.


Durante quase uma hora o associado conversou com a nossa equipe de reportagem, destacou os avanços da Justiça rondoniense, lembrou-se dos “7 Samurais do Judiciário de Rondônia” – apelido carinhosamente dado por Dimas aos sete primeiros integrantes da Corte do estado e revelou que sente falta dos tempos em que exercia a profissão no Tribunal de Justiça de Rondônia e saudade de Guadalupe no Piauí – terra natal do escritor que foi inundada devido a construção da Usina Hidrelétrica de Boa Esperança - hoje o município não existe mais porque ficou debaixo d’água.


Perfil

Dimas Ribeiro da Fonseca nasceu em Guadalupe-PI aos 25 de março de 1931. Veio à Rondônia pela primeira vez, quando ainda era procurador no Distrito Federal em 1975, para integrar uma comissão que tinha como tarefa levantar o patrimônio indígena do Brasil.


A segunda vez também ocorreu nos tempos em que o estado ainda era Território Federal subordinado à Brasília com objetivo de fiscalizar as ações do Ministério Público na região, inspecionando a promotoria e curadoria.


Quando foi promulgada a lei 41 que transformava Rondônia de território para estado, o associado vivenciou o ato solene da transformação e ao retornar à Brasília para o cargo de procurador recebeu convite do governador Jorge Teixeira para integrar a primeira composição do novo Tribunal de Justiça. Ao lado dos desembargadores Hélio Fonseca, Aldo Castanheiras, Fouad Darwich (1º presidente do TJRO), José Clemenceau Maia, Darci Ferreira e César Montenegro, Dimas Fonseca é o sétimo integrante dos “7 Samurais do Judiciário de Rondônia”.


Obras

O associado começou a escrever ainda criança, inspirado pelas obras literárias do escritor português Bocage. O improviso do poeta europeu fascinou o magistrado. “Uma vez fui chamado para comer uma coalhada na casa de meu avô e tinha uma tia que estava muito velha e caracterizada pela ira. Você não podia dizer nada que ela não entendesse que ameaçava bater nas crianças. Aí fiz uma quadra poética, não disse nada porque fiquei com medo, mas fiquei com aquilo na cabeça e disse para meu irmão gêmeo ‘os óculos são de vidro, os aros de prata e olhos de barata”, não tinha nem 6 anos quando escrevi essa bobagem”, conta rindo o associado.


As obras de Dimas giram entorno de poemas na forma de sonetos ou de tercetos. Ele afirma que a prosa ocorre conforme o momento em que escreve e dá feição ao gênero que foi produzido. O associado acredita que as produções tem ligação com infinito isso porque, “quando era criança e assisti ao meu primeiro eclipse solar eu chorei muito. Via o mundo se acabar e o pessoal lá do meu Piauí chorava sabendo que há qualquer momento viria a escuridão e então nos levaram até a Igreja para tocar o sino. Esse eclipse foi no dia 01 de outubro de 1940 e eu tinha 9 anos”, lembra com saudosismo. Os fenômenos naturais colocados em choque com o desenvolvimento das ciências inspiram o magistrado.


Para produzir a obra “Gonçalves Dias: Amor e Morte” bastou ler um bilhete de despedida do poeta maranhense escrito em Paris, no Porto do Avré na França, encaminhado para o amigo Téofilo Leal que vivia em São Luís. A carta dizia “Meu caro Teófilo devo chegar aí no começo de novembro pelo mar. Se não ficar nele” e aconteceu que o escritor naufragou abordo do navio Ville de Boulogne.


“Ele amou uma menina de 14 anos, chamada Ana Amélia, mas Gonçalves Dias era filho de uma índia com português, então era mestiço e os maranhenses na época não admitiam casar pessoas brancas com mestiços. Ele escreveu uma linda carta para a mãe dessa moça pedindo a filha dela em casamento e a mãe respondeu secamente ‘não’. Depois disso, Gonçalves Dias ficou louco de paixão, foi embora para a Europa e teve uma série de doenças. Ana Amélia casa com um português rico que depois abre falência e vão embora para Portugal. Lá os três se reencontram e Gonçalves Dias escreve um dos poemas mais bonitos em matéria de amor chamado ‘Ainda uma vez adeus’ e ela fica encantada”, narra emocionado o magistrado.


Confira as melhores partes da entrevista com desembargador Dimas Fonseca, aposentado há quase 14 anos do Tribunal de Justiça de Rondônia


Ameron - O senhor sente falta das atividades do Tribunal de Justiça?

Dimas - Sinto porque é um tribunal que eu vi nascer e ajudei a dar os primeiros passos, vi chegar os primeiros juízes e apliquei o primeiro concurso junto com os meus companheiros da Corte. Eu vi esse pessoal crescer em todos os aspectos. Até hoje quase 14 anos aposentado é raro o dia em que eu deixo de ir lá. É como se fosse um ponto e nesse ponto eu vejo mudanças, colegas que como eu já pintaram os cabelos, outros aposentaram, alguns continuam de quando em quando visitando.


Ameron – O que o senhor mais sente falta na época em que exercia a profissão?

Dimas - O aconchego, as trocas de ideias, as previsões futuras para aquela Corte que vimos nascer em 1981. Naquele tempo improvisaram muita coisa porque não tinha como resolver, mas era necessário dar uma resposta. Achei fantástica a distância do Poder Central, da capital da República. Por exemplo, o jornal chegava com 15 dias depois de publicado para vermos as decisões da Corte Superior.


Ameron – O que o senhor acha dessas transformações que o tribunal vem passando com a utilização das ferramentas tecnológicas?

Dimas - Simplesmente fascinante para quem pensa no futuro. Só as pessoas que fazem parte dessa Justiça Itinerante sentem como o homem é atendido com presteza, atenção e respeito. A felicidade que a gente sente no olhar deste homem que nem certidão de nascimento possuía e sai de lá com o documento na mão. Com a Justiça Rápida não tem essa história de venha buscar depois, é na mão e ele sai de lá satisfeito. Ou uma separação judicial na qual os dois concordaram em se separar e auxiliar a família, já sai com uma decisão também. Ou o alimento para o filho que está largado com a mãe chorando e já sai com a condenação do devedor. É realmente fantástico e eu fui o primeiro defensor da Justiça Itinerante em Brasília na década de 70.


Ameron – Como surgiu esse apelido “Os 7 Samurais da Justiça de Rondônia”?

Dimas - Foi um encontro no gabinete do Fouad e ele costumava fazer esses encontros quase semanais, em um deles não recordo se havia visita do Cônsul japonês. Mas o certo é que vendo os sete companheiros que estavam comigo e em torno do presidente me lembrei e disse “Minha gente, essa Corte está parecendo com os sete Samurais do Império Japonês” e o Fouad virou-se, riu e disse “O senhor se saiu muito bem porque nós sabemos que esses japoneses eram muito fortes, corajosos e se caracterizam pela fidelidade ao Imperador e aqui vocês estão jurando fidelidade à Justiça”.