Advogado obtêm suspensão de reintegração liminar do Bairro Aparecida e evita tragédia de despejo de mais de 900 famílias

A reintegração estava marcada para o dia 04/10/15, domingo, mas uma medida cautelar ajuizada no Tribunal de Justiça evitou a tragédia.

Publicada em 05 de October de 2015 às 11:55:00

O advogado Renan Maldonado obteve, em decisão publicada hoje, suspensão de reintegração de posse do Bairro Aparecida, que é localizado atrás da Faculdade Uniron.

A reintegração estava marcada para o dia 04/10/15, domingo, mas uma medida cautelar ajuizada no Tribunal de Justiça evitou a tragédia.

O Bairro Aparecida em Porto Velho possui mais de 900 famílias com praticamente cinco anos de ocupação.
A banca de advogados do Escritório Renan Maldonado alegou em seu recurso inúmeras nulidades ocorridas em primeiro grau. Dentre elas foi a falta integração dos moradores no processo, bem como a falta de intimação do Ministério Público para integrar a ação.

Além disso, não haveria como o juiz conceder uma liminar em sentença sem elementos concretos.

Na sua decisão o Desembargador Isaias Fonseca acatou os argumentos dos advogados e ressaltou que “deveras, entre os bens em discussão na lide (cautelar e reivindicatória) deve-se, pois, privilegiar a dignidade da pessoa humana, pois, uma vez procedida a imissão, os autores deixarão suas respectivas residências, as quais podem ser as únicas”.

A decisão do Desembargador mostrou a preocupação com o grave problema da moradia em Porto Velho, com aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana.

Apesar de não ser definitiva a decisão do Tribunal, a reintegração fica suspensa até o julgamento definitivo do caso.
Em nota o Dr. Renan Maldonado ressalta que “ essa ação faz parte do trabalho social do seu Escritório, pois levar Justiça a quem mais precisa é em primeiro lugar um ato cristão”. Sustenta também que continuará na luta por esse Bairro até a definitiva regularização.

Confiram a decisão na íntegra:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA
2ª Câmara Cível / Gabinete Des. Isaias Fonseca Moraes

Processo: 0801420-96.2015.8.22.0000- CAUTELAR INOMINADA
Relator: ISAIAS FONSECA MORAES
Data distribuição: 30/09/2015 12:11:37
Autores: ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DO BAIRRO
APARECIDA e outros
Advogado(s) do reclamante: ► RENAN GOMES MALDONADO DE JESUS
Ré: FÁTIMA DE LOURDES BISCONSIN TORRES
Advogado(s) do reclamado: WAGNER VASCONCELOS XAVIER
DE CARVALHO
DECISÃO
Vistos,
A associação dos Moradores do Bairro Aparecida e outros ajuízam ação cautelar inominada contra Fátima de Lourdes Bisconsin Torres (p. 756/780), vindicando, em síntese, seja cassada ou
suspensa a parte da sentença condenatória exarada na ação reivindicatória autuada sob o n. 0022125-53.2012.8.22.0001, atinente à antecipação dos efeitos da tutela consubstanciada na
imissão na posse contra os autores.
Defende o cabimento da ação cautelar e a competência deste Tribunal de Justiça para processá-la e julgá-la, ante a pendência de recurso de apelação no Juízo a quo.
Expõe que a ação originária está eivada de ilegalidades e nulidades absolutas, dado que o Juízo a quo denegou alguns pedidos e outros simplesmente se omitiu, a saber:
a) denegação da inclusão de centenas de moradores da área em testilha como parte ré no processo, com consequente falta de abertura de prazo para contestação e demais defesas;
b) denegação do pedido de intimação do Município de Porto Velho, haja vista a abertura de ruas e áreas públicas (desapropriação indireta);
c) denegação da intimação do Ministério Público, ante o conflito de terras anunciado, envolvendo crianças e idosos;
d) intimação da União ante o interesse desse ente em razão da existência de diversas servidões federais na área;
e) denegação da devolução do prazo de contestação, ante a falta de citação dos moradores que se apresentaram de forma espontânea, caracterizando lealdade e boa fé.
Sustenta, também, a inexistência do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da antecipação dos efeitos da tutela.
É o relatório. DECIDO.
O Código de Processo Civil preceitua em seu art. 800, parágrafo único que "interposto o recurso, a medida cautelar será requerida diretamente ao tribunal".
Acerca do assunto em tela oportuna a lição de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery (in Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em vigor, RT, 12ª ed., 2012, p. 1.330/1331): "4. Competência do tribunal ad quem. A norma confere competência
ao tribunal destinatário do recurso (ad quem) se e quando já tiver sido interposto o recurso. Essa circunstância está expressa no par. ún. Do CPC 800, de modo que o juízo a quo, isto é, aquele que prolatou a decisão recorrida, deixa de ser competente para toda e qualquer medida posterior à interposição do recurso. Portanto, a cautelar posterior à interposição do recurso, ainda que não proferido juízo de admissibilidade, recebendo ou indeferindo o processamento do recurso, tem de ser ajuizada perante o tribunal ad quem, que é o competente para processá-la e julgá-la. `A lei não exige que o recurso tenha sido admitido ou recebido para processamento para que o tribunal ad quem seja competente para apreciar e decidir a cautelar' (Nery. Recursos, n. 3.5.2.4, p. 459). Considera-se interposto o recurso assim que despachado ou protocolizado na secretaria judicial respectiva. Nada obstante a letra expressa do CPC 800 par. ún., dando competência ao tribunal ad quem para a cautelar, não a partir da admissibilidade do recurso, mas sim de sua simples interposição, quanto às cautelares na pendência de RE o STF sumulou entendimento noutro sentido (STF 634 e 635, cujo inteiro teor se encontra na casuística abaixo)".
Em verdade, a competência do juízo de primeiro grau encerra-se com a prolação da sentença, ressalvadas as hipóteses insertas no art. 463 do CPC.
Outrossim, consta nas razões desta ação a notícia de interposição do recurso de apelação. Demais disso, na data de hoje foi realizada ligação para o juízo originário, o qual confirmou a interposição do apelo pela parte ré, ora autora desta ação cautelar.
Manifesta, portanto, a competência deste Tribunal para processar e julgar a ação cautelar inominada, razão pela qual passo a apreciar o pedido liminar nela vindicado.
Pois bem. É cediço que a análise do pedido liminar faz-se mediante uma análise sumaríssima do processo a fim de verificar o preenchimento dos requisitos necessários à sua concessão, quais sejam: a fumaça do bom direito e o perigo da demora.
Extrai-se da documentação apresentada a presença dos requisitos aptos à concessão da medida liminar pleiteada, na medida em que no imóvel objeto da lide originária residem diversas famílias as
quais, possivelmente, não teriam outro local para residirem com a feitura da desocupação da área o que, por via reflexa, atingiria a dignidade da pessoa humana.
Anoto, não estar se fazendo juízo de mérito quanto à pretensão vindicada na ação originária o que, aliás, vai ser objeto de análise no recurso de apelação interposto, atendo-se, por óbvio, ao princípio
da dialeticidade.
Contudo, o cumprimento da ordem de imissão na posse concedida em sede de sentença na ação reivindicatória causaria graves prejuízos aos requerentes o que, ao que tudo indica, possuem
parcos recursos financeiros. De outro lado, a perda eventualmente suportada pela requerida, ora autora da demanda originária, restringir-se-ia ao direito patrimonial.
Deveras, entre os bens em discussão na lide (cautelar e reivindicatória) deve-se, pois, privilegiar a dignidade da pessoa humana, pois, uma vez procedida a imissão, os autores deixarão suas respectivas residências, as quais podem ser as únicas.
Outrossim, a concessão da liminar vindicada nesta ação cautelar acaba, por consequência, concedendo maior prazo para que aqueles que ocupam (ir)regularmente a área em litígio ¬ assim digo por não ter transitado em julgado a sentença de primeiro grau possam ter maior prazo para se alocarem em local diverso.
Saliento, ainda, que apesar de não se tratar de antecipação dos efeitos da tutela ¬ situação em que se exige a comprovação da verossimilhança das alegações e fundado receio de dano irreparável
ou de difícil reparação ou abuso de direito ou manifesto propósito protelatório do réu -, consto inexistir risco de irreversibilidade do deferimento do pedido liminar e que, ainda, caso seja necessário, a medida poderá ser revogada a qualquer tempo.
Isso posto, concedo a liminar pleiteada para determinar a suspensão da antecipação dos efeitos da tutela consubstanciada na imissão na posse concedida na sentença exarada na ação reivindicatória
até o julgamento do recurso de apelação interposto.
Intime-se a parte contrária para, querendo, ofereça resposta no prazo de 5 dias.
Em seguida, ao MP.
Oportunamente, tornem-me os autos conclusos.
Por fim, ante a manifesta hipossuficiência, concedo a gratuidade
judiciária aos autores, o que faço nos termos do art. 12 da Lei n.
1.060/50.
Sem prejuízo, comunique-se ao Juízo a quo com urgência.
PORTO VELHO, 1 de outubro de 2015
Desembargador ISAIAS FONSECA MORAES
Relator