Policiais militares que cometem crimes comuns devem ser julgados pela Justiça estadual, defende MPF

Posicionamento está em dois pareceres enviados ao STJ em casos de conflito de competência entre a Justiça comum e a Justiça Militar.

Fonte: AGU
Publicada em 18 de maio de 2018 às 11:17
Policiais militares que cometem crimes comuns devem ser julgados pela Justiça estadual, defende MPF
Crédito: Fotos Públicas/Thiago Gomes/Agência Pará

“O Direito Penal Militar deve abarcar somente as condutas de militares que atentem contra a hierarquia, a disciplina e as instituições militares”. Esse é o posicionamento defendido pelo Ministério Público Federal (MPF) em dois casos de conflito de competência a serem julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os pareceres são da subprocuradora-geral da República Luiza Cristina Frischeisen, coordenadora da Câmara Criminal do MPF (2CCR).

O primeiro processo discute a competência para julgar crimes de desobediência e de tráfico de drogas atribuídos a uma policial militar de Minas Gerais. No entendimento do MPF, o crime de desobediência – praticado contra a hierarquia e a disciplina da organização policial – deve ser julgado pela Justiça Militar. Já a apuração do delito de tráfico de drogas – cometido fora do horário de serviço em local não submetido à administração militar – compete à Justiça comum, devendo o crime ser processado e julgado pela 2ª Vara de Tóxicos de Belo Horizonte (MG).

O entendimento baseia-se em súmula vinculante do próprio STJ (Súmula 90), segundo a qual “compete à Justiça Estadual Militar processar e julgar o policial militar pela prática do crime militar, e à [Justiça] comum pela prática do crime comum simultâneo àquele”. Para o MPF, ao contrário do que aponta o juiz da 3ª Auditoria da Justiça Militar do Estado de Minas Gerais no processo, a Súmula 90 não foi superada pela Lei 13.491/2017 – que alterou o Código Penal Militar.

Primeiro porque, conforme jurisprudência da própria Corte Superior, o policial militar estadual não se enquadra na definição de militar prevista no Código Penal Militar (art. 22 do CPM), entendimento que não muda com a nova legislação. “A justificativa da mudança promovida pela Lei 13.491/2017 foi apenas a alteração da situação dos militares federais”, explica Frischeisen. Segundo porque, ainda que se admita que a Polícia Militar esteja contemplada pela definição de militar descrita no CPM, a tipificação da conduta como crime militar exigiria a presença de outras condições, como estar a serviço ou em lugar sujeito à administração militar no momento do crime, o que não ocorreu no caso em análise.

Alternativa – Caso o STJ entenda que a Súmula 90 foi superada com a edição da Lei 13.491/2017, o Ministério Público Federal requer a declaração incidental de inconstitucionalidade da norma pela Corte Superior. “O controle difuso de constitucionalidade, previsto no ordenamento jurídico brasileiro, autoriza que qualquer juiz ou tribunal declare inconstitucional uma norma”, assinala Frischeisen.

Entre os argumentos apontados pela subprocuradora-geral para que a norma seja declarada inconstitucional está o próprio histórico do projeto de lei. “A motivação da mudança legislativa foi alterar a competência de julgamento apenas dos militares das Forças Armadas, pois não há qualquer menção aos militares estaduais”, destaca Luiza, completando que, no substitutivo aprovado pela Congresso Nacional, havia uma cláusula de vigência da lei até dezembro de 2016, em razão dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos no Rio de Janeiro.

A promulgação do projeto como lei permanente só aconteceu em razão do veto presidencial ao artigo que previa a vigência temporária da norma, o que, segundo Frischeisen, “adulterou, por completo, a vontade do Congresso Nacional”. Tal manobra violou a finalidade da proposta e viciou o processo legislativo, o que permite a declaração de inconstitucionalidade do diploma legislativo, conclui a subprocuradora-geral.

Frischeisen afirma ainda que a Lei 13.491/2017 promoveu uma ampliação indevida do conceito de crime militar previsto na Constituição Federal, ao permitir que todos os crimes previstos no ordenamento jurídico possam ser considerados como militares. Segundo a subprocuradora-geral, o legislador constitucional distinguiu a competência em razão do agente (crime praticados por militares) e em razão da matéria (crime militares). “Infere-se, portanto, que a definição de crime militar deve ser excepcional”, ressalta.

Raciocínio similar – O mesmo entendimento é adotado pelo MPF no conflito de competência entre a Justiça comum e a Justiça Militar em relação ao processo em que um policial militar é acusado de lesão corporal leve e ameaça a dois seguranças do hospital universitário de Jundiaí (SP), onde a filha estava internada.

Após ter negada sua visita fora do horário permitido, o policial reagiu dando uma cabeçada em um dos seguranças e apontando a arma em seu nome contra o outro. O agressor foi contido por um guarda municipal e conduzido à delegacia da Polícia Civil, onde assinou um termo circunstanciado.

Para Luiza Frischeisen, “os delitos de ameaça e lesão corporal foram cometidos fora do horário de serviço, em local não submetido à administração militar e com utilização de arma de fogo do próprio acusado. Assim, as condutas não se enquadram em nenhum dos incisos do art. 9º do CPM. Consequentemente, não há crime militar e, por isso, o feito deve ser julgado pela Justiça comum estadual”, estipula no parecer.

Leia a íntegra dos pareceres do MPF no CC 157530/MG e no CC 157667/SP.

Winz

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