Transposição: AGU no “paredão”.....

Veja o raciocínio jurídico sobre os demitidos pelo então governador José Bianco.

Publicada em 09 de January de 2014 às 07:56:00

Carlos Terceiro, de Brasília


O parecer técnico-jurídico normativo vinculante prometido pelo presidente da Comissão Interministerial da Transposição em Brasília, Geraldo Nicoli,  e pelo Secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Planejamento, Sérgio Mendonça, fornecido pela Advocacia Geral da União (AGU) , ainda não saiu. Mas uma coisa é certa: não poderá ser prejudicial aos chamados demitidos do governo Bianco, porque uma “pedra no sapato” dos advogados da União surgiu com uma tese lógica jurídica inconstestável em defesa desses servidores.

O deputado Amir Lando, que é advogado, inconformado com as várias reuniões infrutíferas e as promessas descabidas, encontrou a argumentação jurídica que deverá ajudar a AGU a fundamentar o tal parecer.

Para isso, ele corre contra o tempo e tenta marcar ainda este mês uma reunião com os advogados da União para discutir previamente o assunto objetivando dirimir as dúvidas sobre os 10 mil servidores que esperam transpor para o governo federal.


Veja o raciocínio jurídico sobre os demitidos: “Não se justifica como óbice à transposição, a suposta interrupção de contrato de trabalho dos servidores públicos demitidos por meio do Decreto 8.954, de 17 de janeiro de 2000, o que somente sob uma primeira e superficial ótica poderia prevalecer”.

É que, na verdade, não se operou a interrupção do contrato de trabalho por força das demissões ocorridas, pois houve decisão judicial reconhecendo a nulidade do ato demissionário e, o ato nulo, por seu turno, não produz qualquer efeito no mundo jurídico. Logo, as demissões não podem ser consideradas como válidas. Se não valeram as despedidas, não se fala em interrupção ou suspensão da relação, mas sim em unicidade desta, como se jamais tivesse havido uma rescisão, para os efeitos jurídicos.

Os servidores contratados antes da Constituição Federal de 1988 foram considerados celetistas pelo próprio Poder Judiciário Estadual de Rondônia, que se embasou numa decisão anterior, a qual não reconheceu a validade de outro Decreto, que os transmudou para o regime celetista, entendendo, com base na dita decisão, que, uma vez inválido o referido Decreto, deveria prevalecer à condição de servidores celetistas.

Diante da reconhecida ausência de competência da Justiça Comum Estadual para dirimir a questão naquela oportunidade, a Justiça do Trabalho foi provocada. Ali, na esfera trabalhista, em sede liminar, posteriormente confirmada, a 2a Vara do Trabalho de Porto Velho reconheceu serem os servidores celetistas e como tal entendeu que até poderiam ser despedidos, por inexistir estabilidade conferida aos servidores celetistas, mas para a validade das demissões, exigiu que fossem observadas as formalidades legais exigidas para essa categoria de servidores, em especial a existência de depósitos de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.

Assim, enquanto não houvesse comprovada existência de depósitos fundiários aos servidores demitidos, alvos do aludido decreto, todos com tempo superior a 17 anos de trabalho prestado para o Estado de Rondônia, em áreas essenciais, a exemplo de saúde e educação, fez constar expressamente que as despedidas seriam nulas de pleno direito, ou seja, como se nunca tivessem ocorrido, determinando o imediato retorno aos quadros, condicionando a validade ao cumprimento de requisitos indispensáveis, como o adimplemento das verbas rescisórias e os recolhimentos do FGTS.

Ainda que posteriormente os servidores tenham celebrado acordo para viabilizar o efetivo retorno, pois os recursos interpostos retardavam o cumprimento da decisão, não há como se olvidar o registro expresso da sentença que fundamentou a imposição da readmissão exatamente na nulidade do ato praticado, tendo-o como inexistente para os efeitos legais, por contrariar princípios e formalidades exigidas para sua validade, posto que servidores celetistas. Esta condição de celetistas exigia, nos termos da lei, a existência de contas vinculadas de FGTS em seus favores.

Se os servidores fossem estatutários, seriam detentores de estabilidade e como tal não poderiam ser despedidos sem prévio processo administrativo. Sendo os servidores celetistas, assim considerados pela Justiça Estadual, que invalidou a transmudação de regime jurídico, poderia haver despedida imotivada, mas desde que observadas às formalidades desta, pois não poderiam tais servidores ficar numa espécie de “limbo”, sem FGTS e sem estabilidade, ao “bel prazer” da Administração Pública.

Assim, se não existentes contas vinculadas com os devidos depósitos do FGTS por todo o período contratual, com habilitação ao levantamento desta parcela, acrescida da indenização compensatória de 40% em virtude da modalidade de rescisão, não poderia haver despedida válida, ainda mais ao se considerar o impacto e o efeito econômico altamente prejudicial aos trabalhadores, que prestaram serviços por longos 17 anos, para então serem abruptamente demitidos, sem qualquer amparo financeiro para lhes amparar enquanto buscassem novos meios de subsistência.


A outra conclusão não se poderia ter chegado senão reconhecer a nulidade dos atos que ensejaram em tão repugnáveis despedidas, destituídas das devidas formalidades, sem observar a forma prescrita em Lei (as verbas devidas a servidores celetistas), mascaradas na necessidade de cumprimento de uma legislação (Lei Camata), que não se cumpria, efetivamente, fato também abordado na decisão judicial.

O ato nulo (neste caso, a despedida dos servidores), como ensina Hely Lopes Meireles, não gera direitos ou obrigações para as partes, não cria situações jurídicas definitivas e não admite convalidação.

A nulidade pode ser absoluta ou relativa. É absoluta, quando se diz que o ato é nulo e relativo, quando passível de anulação, valendo até o dia em que se reconheceu a irregularidade. No caso das demissões em tela, foi considerada a nulidade do ato, ou seja, o ato da despedida, para os efeitos jurídicos, não teve valor algum, equivaleu a não ter existido, operando-se a nulidade absoluta, ou de pleno direito.

Nessa condição, é como se Decreto 8.954, de 17 de janeiro de 2000 não tivesse qualquer validade, como se nunca tivesse existido, havendo que se reconhecer, para os efeitos legais, que os contratos de trabalho dos servidores celetistas afetados pelo referido Decreto, eram, em verdade, unos, sem que tenha sido afetada a continuidade das respectivas relações de trabalho.

Por conseguinte, havendo apenas um contrato de trabalho plenamente válido entre o Estado de Rondônia e os servidores celetistas admitidos anteriormente aos cinco anos que antecederam a promulgação da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988, sumariamente despedidos pelo Decreto 8.954/2000, não se pode falar em qualquer circunstância interruptiva do direito e, como tal, a eles também são aplicáveis às regras da transposição, sob pena de lhes estar sendo novamente retirado mais outro direito decorrente do sagrado (e muitas vezes sangrado!) labor, na contramão de todos os princípios universais de prestígio à dignidade humana e ao equilíbrio das relações sociais”
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Agora, é só aguardar para ver o que os advogados da União vão dizer sobre o assunto. Pouca coisa poderão fazer.