É só uma aventura de delegados irresponsáveis, que serão punidos pela santa lei do abuso de autoridade, diz juiz de Cacoal

"Há muito tempo minhas decisões, como é público, têm incomodado às instituições policiais que, sendo republicanas, deveriam ser gratas por quem mais delas exige. No entanto, como represália, na medida que se aprofundam minhas decisões que ordenam providências, me caluniam"

TUDORONDONIA
Publicada em 26 de outubro de 2019 às 02:22
 É só uma aventura de delegados irresponsáveis, que serão punidos pela santa lei do abuso de autoridade, diz juiz de Cacoal

Leia tambémPolícia levanta suspeita de envolvimento de juiz em morte de advogado; magistrado acusa polícia de querer acobertar crimes

Juiz de Cacoal (RO) fala sobre operação policial de busca e apreensão em sua casa. ASSISTA

Cacoal, Rondônia - Na manhã desta sexta-feira, o juiz titular da 1a Vara Criminal de Cacoal, Carlos Rosa Burck, foi surpreendido em casa com o cumprimento de um mandado de busca e apreensão expedido pelo desembargador Daniel Ribeiro Lagos, do Tribunal de Justiça de Rondônia, a pedido da Polícia Civil, que, segundo o proprio magistrado, tenta relacionar seu nome ao assassinato do advogado Sidney Sotele, morto com 14 tiros de pistola .40 em frente à Câmara Municipal. O juiz Carlos Burck registrou um boletim de ocorrência por suposto abuso de autoridade contra delegados que presidem o inquérito e solicitaram o mandado. O magistrado também emitiu a seguinte nota de esclarecimento: 

"Em razão de notícias sensacionalistas e rasas, provocadas pelo dissimulado vazamento do que seria um processo em segredo de Justiça, para pôr as coisas no devido lugar, tranquilizando os amigos e amenizando a alegria dos inimigos, esclareço o ocorrido.

Na data de hoje fui surpreendido, por volta de 6h30m, pelo cumprimento, por delegados de polícia de Cacoal, de mandado de busca e apreensão expedido pelo eminente Desembargador Daniel Ribeiro Lagos do E. Tribunal de Justiça de Rondônia.

A ordem judicial determinava a apreensão somente dos celulares, meu e de minha esposa. Tomei conhecimento também da quebra dos sigilos bancários e telefônicos nossos. No fórum foram apreendidos dois celulares que, em decisão judicial amplamente dada a conhecer à polícia e Ministério Público, havia eu determinado fossem lacrados e aguardasse posicionamento da Promotoria. Os celulares em questão são de vitimas de bárbaro crime. Neste processo venho apontando em decisões inúmeras omissões da Polícia Civil, inclusive chamando o Ministério Público a exercer o controle externo da atividade policial.

Em outros processos, como juiz de custódia, venho determinando constantemente a apuração de responsabilidade de agentes policiais que descumprem direitos, obrigação indeclinável do magistrado. Também tenho sido inflexível quanto à (i)legalidade de prisões em flagrante, fundamentando a exaustão todas as determinações e sempre com respaldo na Constituição, leis, e atos administrativos do CNJ e do E. TJRO.

Há muito tempo minhas decisões, como é público, têm incomodado às instituições policiais que, sendo republicanas, deveriam ser gratas por quem mais delas exige.

No entanto, como represália, na medida que se aprofundam minhas decisões que ordenam providências, me caluniam.

Pelo que deu para entender da r. decisão, que não venho acompanhada do pedido formulado por delegado(s) de Cacoal, consideram-me suspeito de envolvimento no homicídio do advogado Sidnei Sotele.

Como não tive acesso à representação ou ao processo, até agora desconheço que sandices poderiam usar para me envolver nesse ato abjeto de ceifar a vida de alguém.

Estou ao mesmo tempo estupefato e indignado.

Mas jamais irão me intimidar !

Tomarei sempre as decisões que, mesmo indigestas a alguns, precisam ser tomadas, observada a impessoalidade e a Lei.

Já levantei todos os dados bancários e telefônicos para remessa ao eminente Desembargador Relator, que muito provavelmente foi levado ao erro com sei lá que tipo de verrinas com que essa gente contrariada com o Estado Democrático de Direito é capaz de querer atingir-me.

No início da noite de hoje registrei Ocorrência Policial noticiando o crime de abuso de autoridade pelos que querem me envolver nesta sujeira.

Essa gente que tenta me achincalhar, para desacreditar minha postura firme na judicatura, como é até ridículo, tinha dado o homicídio do advogado Sidnei Sotele como resolvida (ver aqui: https://www.tudorondonia.com/…/policia-prende-autores-da-mo…).

Mais indigna é a tentativa de envolver meu nome, porque todas as prisões dos supostos envolvidos nos homicídios em sequência, Cacoal e em Ministro Andreazza, assim como quebras de sigilo e buscas e apreensões, foram determinadas por mim.

São tempos estranhos, como diz o Ministro Marco Aurélio.

Amigos e familiares não se preocupem. É só uma aventura de delegados irresponsáveis, que serão punidos pela santa lei do abuso de autoridade. Sofrerão nos tribunais dos homens e nos de suas consciências, se as têm.

Em breve terão de pagar literalmente ($) por tentarem usar o Judiciário para menoscabar quem tem a coragem de dizer-lhes não.

Há juízes em Berlim, Cacoal e no E. TJRO!"

 CONTO O MOLEIRO DE SANS SOUCI

No conto Le meunier de Sans-Souci (O moleiro de Sans-Souci) de François Andrieux, narra-se  que quando Frederico II, então Kaiser da Prússia, pretendia ampliar seu palácio de verão em Sans-Souci, encontrou resistência por parte de um moleiro, proprietário de um moinho que ocupava terras necessárias para a ampliação.

 O Kaiser, após inúmeras propostas recusadas, teria chamado o moleiro à sua presença e, do alto de sua soberba, afirmara que poderia expropriar o moinho contra a vontade do moleiro se assim entendesse, ao que o moleiro respondera “Vous!… de prendre mon moulin? Oui, si nous n’avions pas des juges à Berlin” (Vós… tomardes meu moinho? Sim, se não houvessem juízes em Berlim).

 

 

Comentários

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    SYRNE LIMA FELBERK DE ALMEIDA 29/10/2019

    Advoguei durante os três anos em que o nobre Magistrado Carlos Roberto Rosa Burck atuou como Juiz Titular da cidade de Presidente Medice , uma pacata cidade onde ocorria crimes de grande repercussão a época. Todavia sempre foi um Magistrado enérgico, mão de ferro, linha dura no combate a criminosos, sendo um Magistrado muito respeitado pelos homens de bem daquela cidade...Trata-se de um Magistrado honrado, digno e que vem prestando serviço de grande relevância social. O Estado polialesco, o arbítrio e a montaria “No cavalo do diabo”!!! São tempos difíceis para os sonhadores. E tão difíceis quanto para os realistas. É preciso encarar o risco de uma retomada, após um breve suspiro democrático, de um estado policialesco que parece avançar com uma versão atualizada da sociedade. Talvez parte desse avanço se deva justamente à preparação – docilização – da sociedade para esse estado antidemocrático. Historicamente, o Estado de polícia é um tipo de Estado em que o soberano é isento de qualquer limite formal ou controle jurisdicional. Em decorrência disso, o campo de ação da polícia acaba por se estender por toda a administração pública, à exceção das forças armadas e nos assuntos financeiros. Aspecto importante desse processo foi a proibição da violência para a solução de conflitos, instituindo-se o monopólio de sua utilização em favor do estado. Mas também era necessário que esse estado fosse constitucional e democrático. A ideia de um estado de Direito fundado na liberdade se opôs ao estado policial caracterizado pelo arbítrio. A polícia é, pois, o órgão de execução da violência legítima pelo estado. Conferir-lhe autonomia é o mesmo que retroceder a um estado policial dentro do estado de Direito. Não há exemplo no Direito comparado ou na História de polícia autônoma em relação ao estado, nem de democracia que tenha sobrevivido a forças armadas ou policiais desvinculadas de controles. Aliás, democracia não convive com poder sem controle. O Estado Policial não é um estado democrático. E quando falamos de Estado Policial não estamos falando apenas da existência de uma hipertrofia de uma instituição policial. Além disso, temos todo o funcionamento policialesco das demais instituições e poderes estatais, seja diretamente com atos autoritários, seja indiretamente legitimando – até mesmo e sobretudo pela omissão – esses atos. Mas existe polícia fora do Estado? Parece ser essa a tecnologia aperfeiçoada que estamos experimentando, o que é assustador já que soma-se à forma tradicional do Estado Policialesco que vem se enrijecendo. Além disso, a Polícia só é uma instituição aceitável na democracia se houver um sistema de justiça que possa lhe regular e reter o poder. Incluindo, no sistema, a função do Ministério Público como fiscal externo da atividade policial (apesar do baixíssimo exercício dessa atribuição constitucional pelo órgão); a Defensoria Pública como promotora de Direitos Humanos; a Ordem dos Advogados do Brasil; a sociedade civil e etc. Contudo, como dito, mesmo na formatação clássica do Estado de Polícia, não é só a Polícia e as instituições correlatas ao sistema de justiça que reforçam seu caráter arbitrário. Policializa-se outras atividades estatais, o que se caracteriza com a atuação das instituições de modo autoritário, sem respeito aos direitos dos indivíduos e, quando não, truculentos e violentos. Kakay considerou que o direito de defesa está "subjugado" e que a "espetacularização" das ações policiais e do Ministério Público ferem o Estado de Direito. "Decisão memorável da Justiça paulista desenhou com precisão o papel do Juiz no processo criminal: "A mais importante missão do juiz criminal é resguardar os direitos fundamentais do cidadão frente ao poder do Estado. Ao juiz criminal cabe a função de resguardar e proteger os direitos individuais do homem diante do poder punitivo do Estado. Este o sentido desta decisão neste writ . Impedir que o poder punitivo do Estado violente os direitos individuais do paciente" (TACrimSP – HC 362.090, Rel. Juiz MARCO NAHUM). "A Legalidade é também a possibilidade --- pelo menos a possibilidade --- (...) da efetivação dos direitos e garantias individuais: não ser arbitrariamente preso nem condenado, não ser torturado, não ter a casa invadida a qualquer hora baseada em meras conjecturas etc. Daí a observação, de ANTOINE JEAMMAUD, de que 'a dominação através do direito apresenta uma especificidade que, pensando bem, faz dela um modo de dominação preferível a qualquer outro' --- que eu complementaria afirmando que o nosso drama está em que a legalidade e o procedimento legal resultam, inúmeras vezes, perversos e violentos, funcionando como as nossas derradeiras defesas, contudo, contra a perversidade e a violência”. E mais adiante: “As alternativas diante das quais nos colocamos não permitem senão uma opção: a que privilegia o Estado de direito , em oposição ao privilégio do Estado autoritário". O Supremo Tribunal Federal rechaça as dimanações hermenêuticas típicas do Estado policialesco e consagra a presunção de inocência como eixo principiológico estrutural do Estado constitucional democrático. Logo, antes de afirmar ser alguém supostamente propenso à criminalidade deve a autoridade embasar-se numa pesquisa sobre as condições subjetivas do agente e decliná-las, racional e fundamentadamente, em sua decisão. EM 16.01.2012 as 21:34 O Secretário-geral da AMB já advertia para os riscos do estado policialesco. Naquele Ano O Secretário-Geral da AMB e ex-Presidente da Amagis-MG, Nelson Missias de Morais, publicou artigo, no Jornal Hoje em Dia, intitulado "Superpoderes trazem o risco de estado policialesco". No HABEAS CORPUS 95.009-4 SÃO PAULO-RELATOR-: MIN. EROS GRAU assim transcreveu: Eu complementaria afirmando que o nosso drama está em que a legalidade e o procedimento legal resultam, inúmeras vezes, perversos e violentos, funcionando como as nossas derradeiras defesas, contudo, contra a perversidade e a violência”. E completei, mais adiante: “As alternativas diante das quais nos colocamos não permitem senão uma opção: a que privilegia o Estado de direito, em oposição ao privilégio do Estado autoritário". Na Aula Magna com que se despediu da cátedra de processo civil, em junho de 2005, o Professor JOSÉ IGNACIO BOTELHO DE MESQUITA, meu colega no Largo de São Francisco --- e ser seu colega, isso me honra sobremodo, isso me honra efetivamente --- denunciou "o apetite tirânico e as inclinações despóticas que informam o ideário do processo autoritário, incivil", para dizer que, graças a esse ideário, o que hoje vige é a regra de que "qualquer um pode ser privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto. Rui Barbosa— Martin Niemöller - 1933 - Símbolo da resistência aos nazistas.: Um dia vieram e levaram meu vizinho que... Como não sou judeu, não me incomodei. No dia seguinte, vieram e levaram meu outro vizinho que era comunista. Como não sou comunista, não me incomodei. No terceiro dia vieram e levaram meu vizinho católico. Como não sou católico, não me incomodei. No quarto dia, vieram e me levaram; já não havia mais ninguém para reclamar... Syrne Lima Felberk de Almeida Advogado-OAB-3186-RO

  • 2
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    Rubens Oliveira da Silva 28/10/2019

    Processe o desembargador Daniel Ribeiro Lagos. Os delegados apenas foram a longa manus da ordem do desembargador referido. Simples assim.

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    Mariana 28/10/2019

    Ué!!!! A magistratura não é contra a Lei do Abuso de Autoridade? Agora virou " Santa Lei"? Quer dizer quando é contra o magistrado é santa, quando é contra os mortais é boa!!!

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