Bandeira Tarifária: o termômetro do consumidor

As Bandeiras Tarifárias, portanto, sinalizam ao consumidor o custo real, a necessidade de redução no consumo e possibilitam menor salto no reajuste tarifário das distribuidoras.

EFRAIN CRUZ
Publicada em 20 de maio de 2019 às 14:59

Efrain Cruz, diretor da ANEEL

Uma das principais finalidades das bandeiras tarifarias é a de permitir que o consumidor de energia elétrica participe ativamente do processo decisório de geração de energia elétrica no país, através de sinais claros, que lhe possibilitem acompanhar mensalmente o custo da geração.

Para entender tal afirmativa é necessário conhecer como funciona a matriz elétrica: em suma, a energia elétrica pode ser obtida a partir de fontes renováveis (hidrelétricas, eólicas, solar, biomassa) ou fontes não renováveis (nuclear, carvão mineral e gás natural), e essa diversidade de fontes é que permite a complementariedade do sistema.

Interessante notar que os dados mais atualizados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) comprovam que, em 2016, a maior parcela de energia gerada no mundo teve origem na queima de carvão (27,9%) e de gás natural (27,7%), seguida da energia nuclear (18%).Enquanto as usinas hidrelétricas ficam na 4ª posição, respondendo por 12,9% do total gerado.

Para falar do Brasil, possuímos uma matriz energética predominantemente limpa: cerca de 84% de toda nossa geração advém de fontes renováveis. A capacidade instalada nacional, em números amplos, é composta de 63,4% de fonte hidráulica; 15,6% da queima de gás, petróleo e carvão; 9,1% de eólicas; 9% de usinas a biomassa; 1,3% de fonte fotovoltaica e apenas 1,2% de nuclear.

Convém mencionar que, para que a energia gerada em diferentes pontos do país chegue na casa dos consumidores, utilizamos o parque

de transmissão brasileiro, chamado de Sistema Interligado Nacional (SIN), que conecta a ampla maioria das regiões– atualmente, com exceção de Roraima que ainda não está interligado. O SIN tem mais de 142 mil quilômetros de rede e a expectativa é de que em 2023 chegue a mais de 185 mil quilômetros.

Entre a geração e a transmissão, há um agente com relevante papel: o Operador Nacional do Sistema – ONS, que coordena e controla o escoamento da energia pelo SIN, sob fiscalização da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

O ONS é responsável por conciliar as fontes de geração disponíveis, tendo sempre por norte a racionalidade dos recursos, a otimização da operação do sistema elétrico e o menor custo, naturalmente observados padrões técnicos e critérios de confiabilidade de cada uma dessas fontes.

Em todo este cenário, há diversos elementos que trazem inúmeras incertezas à previsão de geração, o que nos permite afirmar que a energia gerada pelas usinas hidrelétricas  normalmente não corresponderá ao total previsto para o sistema, em razão da insuficiência nos reservatórios, principalmente nos períodos secos.

Apesar de serem muito mencionadas, as eólicas e as fontes fotovoltaicas são fontes que, além de representarem apenas 10,4% da capacidade instalada, possuem uma forte variação, ou seja, não geram energia que possa suprir toda a necessidade nacional de modo contínuo. Como é de se supor, a energia solar só possui geração a partir de sua fonte primária – o Sol – e a eólica, através do vento. Logo, por serem fontes dependentes da natureza e sem a possibilidade de guardar a energia, como é feito nas barragens das hidroelétricas, podem ser utilizadas como importantes fontes complementares.

Ratifique-se que o ONS deve garantir suprimento de toda a necessidade de energia do país – denominada por carga – conciliando todas essas fontes e

as linhas disponíveis no SIN. No entanto, em certos períodos do ano, quando a hidraulicidade resta baixa e as outras fontes não conseguem suprir a demanda, é necessário fazer uso das usinas térmicas, que produzem energia da queima de recursos não renováveis e, justamente por isso, são fontes de geração com preços consideravelmente mais elevados.

O grande desafio da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL reside em chegar o mais próximo da previsão correta do preço e montante da energia disponível para os próximos períodos, levando em conta todas as variáveis e cenários possíveis, sem deixar de adentrar na hidrologia, que evidentemente tem sido um dos maiores desafios do setor elétrico brasileiro.

A busca pela precisão dessas previsões torna-se valiosa, na medida em que a legislação nacional garante às distribuidoras neutralidade dos custos relativos à aquisição e transporte de energia e encargos setoriais (a exemplo da Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica – PROINFA etc.) – o que no setor elétrico é denominado por Parcela A. As componentes de custo da Parcela A, por sua vez, não são gerenciáveis pelas distribuidoras. Por isso, devem ser repassadas às tarifas sem margem de lucro. Esse racional foi, inclusive, estabelecido em Lei.

Neste ponto é até conveniente desmistificar um senso comum dos consumidores, de concluírem que a remuneração das distribuidoras é derivada da venda de energia elétrica. A remuneração deriva essencialmente dos ativos de distribuição dessa energia e da parcela de gestão eficiente, ou seja, ter um custo menor que empresas similares.

No tocante à energia, encargos setoriais e tributos, as concessionárias são meras arrecadadoras, repassando os recursos para seus efetivos titulares, quais sejam: geradores de energia, transmissoras, gestor CDE, União, Estados, Distrito Federal e municípios. Em média, das faturas de energia que cada consumidor brasileiro paga, algo em torno de 17% é destinado às distribuidoras.

Neste modelo regulatório, os reajustes concedidos pela ANEEL têm sempre por norte os próximos doze meses, ou seja, estabelecer uma tarifa de equilíbrio, que consiga fazer com que a distribuidora administre seus custos e, primordialmente, consiga quitar as parcelas de tributos, energia, transmissão e encargos. Quanto mais próxima do realizado for a previsão da ANEEL, menores serão os saltos de tarifa de um ano para o seguinte.

Dito de outra maneira, se a ANEEL fez uma previsão de custo, estabeleceu uma receita com base numa previsibilidade e a realidade não se concretizou,

torna-se necessário um incremento de receita para fazer jus aos custos ocorridos.

Diante de todo este cenário, entra a figura das Bandeiras Tarifárias, justamente para evitar que o salto entre a tarifa vigente e o próximo reajuste seja elevado. A principal finalidade do mecanismo é a de que, sendo necessária a aquisição de energia mais cara do que a prevista, dá-se um sinal ao mercado e ao consumidor, por meio das bandeiras. Naturalmente, além de evitar grandes diferenças entre a receita para custear energia prevista e a realizada, o consumidor tem acesso direto à informação de geração do país.

Com isso, todos ficam cientes de que a energia naquele mês custará mais do que o previsto e do que foi estabelecido na tarifa. Deste modo, a distribuidora necessitará arrecadar mais para corresponder à realidade. Com a sinalização dada pela ANEEL, o consumidor tem a opção de calibrar seu consumo, diminuindo a despesa final da sua fatura. Por outro lado, se o consumidor responde à esta sinalização, a carga total demandada naturalmente diminui e, por consequência, térmicas podem ser desligadas. Nesta via, portanto, cabe ao consumidor o papel elementar de modular a necessidade de suprimento nacional. Toda decisão será tomada para garantir que sua necessidade seja atendida.

E qual o motivo das cores? Simplesmente uma sinalização dos preços, em referência ao sinal de trânsito. Quando verde, o custo previsto na tarifa está próximo ao realizado; amarelo significa que a energia está um pouco acima do previsto e já a vermelha, em patamares 1 ou 2, sinaliza que a diferença chega a níveis altos, o que tende a ocorrer nos períodos mais críticos.

Em outra via, fato é que sem a bandeira tarifária, além de ocorrer um grande descompasso entre o custo da geração e o valor arrecadado dos consumidores, desequilibrando o caixa das distribuidoras, o impacto de reajuste tarifário seria maior no próximo ciclo.

As Bandeiras Tarifárias, portanto, sinalizam ao consumidor o custo real, a necessidade de redução no consumo e possibilitam menor salto no reajuste tarifário das distribuidoras. Sendo lúdico, portanto, a ANEEL dá o sinal para o consumidor, apontando quando o custo da energia está dentro do previsto ou quando ela supera as expectativas. Com isso, as bandeiras dão o poder decisório para o consumidor: é ele quem ajudará a decidir se o custo de geração será acentuado ou, caso reaja prontamente à sinalização, se as térmicas poderão ser desligadas. Portanto, as bandeiras empoderam os consumidores, que passam a ser agentes ativos do processo de geração de energia elétrica no país.

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