Cármen Lúcia cria protocolo e cadastro de presas grávidas e lactantes

As visitas representaram uma ação inédita do Poder Judiciário nos cárceres brasileiros a fim de verificar as condições das presas gestantes e que estão amamentando.

Luciana Otoni | Agência CNJ de Notícias
Publicada em 04 de junho de 2018 às 12:04
Cármen Lúcia cria protocolo e cadastro de presas grávidas e lactantes
CNJ constatou, até o fim de abril, que os estabelecimentos penais femininos tinham 212 mulheres grávidas e 179 lactantes. FOTO: Luiz Silveira/Agência CNJ

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vistoriou, entre janeiro e abril de 2018, 33 estabelecimentos penais femininos que custodiam mulheres grávidas e lactantes. As visitas representaram uma ação inédita do Poder Judiciário nos cárceres brasileiros a fim de verificar as condições das presas gestantes e que estão amamentando.

A partir destas observações dos presídios feminino, a presidente do CNJ, ministra Cármen Lúcia, determinou a criação do Cadastro Nacional de Presas Grávidas e Lactantes e a elaboração de um protocolo de recomendações ao sistema prisional para cuidados padronizados à saúde das detentas gestantes, das lactantes e de seus recém-nascidos nas prisões.

Até o encerramento das visitas, no fim de abril, os estabelecimentos penais femininos tinham, segundo os números apurados, 212 mulheres grávidas e 179 lactantes. O Cadastro Nacional das Presas Grávidas e Lactantes, cujos dados vêm sendo divulgados no portal do CNJ desde janeiro deste ano, reflete o interesse da sociedade em ter informações sobre o tratamento que o Estado dispensa a essas mulheres e a seus bebês mantidos nos cárceres. Veja AQUI o quadro em constante atualização

O trabalho foi realizado pela juíza auxiliar da Presidência do CNJ Andremara dos Santos e pela assessora especial Luísa Cruz, responsáveis pela coleta de dados e análise das condições físicas das unidades prisionais, bem como pela verificação dos serviços de saúde destinado a essas mulheres.

Ao falar sobre as visitas que fez aos presídios, a juíza auxiliar salienta a perspectiva do gênero e a importância de se ter um olhar aguçado em relação aos diversos tipos de violência contra a mulher. “É preciso destacar a característica mais relevante da Política Judiciária Nacional de Enfrentamento da Violência Contra a Mulher, e como é essa política, que imprime a perspectiva de gênero na atuação institucional do Judiciário dentro de suas atribuições”, diz. 

Em cada uma das visitas aos estabelecimentos penais, a magistrada utilizou um formulário com 30 perguntas. Entre elas, foram feitas indagações aos administradores dos estabelecimentos penais sobre a existência de acompanhamento médico às grávidas, realização de pré-natal, cuidados pós-parto e local de realização dos partos.

Em termos de abrangência, o CNJ esteve em presídios femininos de 26 unidades da Federação. Ficou de fora apenas o Amapá pelo fato de não ter sido constatado no Estado a existência de detentas gestantes ou que estivessem amamentando.

Contrastes

A realidade contrastante vista nas celas reforçou a necessidade de o CNJ propor uma padronização dos cuidados médicos às mulheres custodiadas pelo Estado, colocando algumas obrigatoriedades entre as quais a de realização de pré-natal para as grávidas. As sugestões para uniformizar o tratamento a essas mulheres estão sendo formuladas e deverão ser concluídas até agosto.

Em uma das situações verificadas, em São Paulo a equipe do CNJ encontrou estabelecimentos penais com boa estrutura física e bem equipados, que possuem brinquedoteca e carrinhos de nenê, mas nos quais cresciam 14 bebês sem registro de nascimento.

Em outro caso, no Centro de Reeducação Feminino de Ananindeua, no Pará, apesar da estrutura física antiga e de haver cinco bebês sem registro, a unidade prisional possuía ambulância à disposição em tempo integral para as grávidas e lactantes e instalações separadas para as gestantes e mulheres que estão amamentando.

No Distrito Federal, a Penitenciária Feminina possuía quatro bebês nascidos de presas grávidas que não estavam devidamente vacinados (sem BCG) após o parto. Em termos de cuidados, as grávidas e lactantes eram alimentadas com a mesma comida destinada às presas doentes.

“Hoje, a situação das grávidas, lactantes e de seus filhos está ao sabor do perfil do gestor”, afirma a juíza auxiliar do CNJ, uma situação que expõe a necessidade de uniformização dos procedimentos.

Equipe do CNJ entrevistando detentas grávidas e lactantes de  presídios  do Paraná (PR). FOTO: Gláucio Dettmar/Agência CNJ 

Bebês no cárcere

O levantamento feito pelo CNJ nos estabelecimentos penais visitados mostrou,  no fim abril, que havia nos cárceres brasileiros 184 bebês com idade entre seis meses e um ano. O tratamento distinto nas prisões a que esses ‘brasileirinhos’, na expressão usada pela ministra Cármen Lúcia, é um dado a mais que reforça a importância de um procedimento padrão no sistema prisional em relação aos cuidados à saúde das mulheres em geral, das grávidas, das lactantes e de seus filhos.

Ao constatar a existência de recém-nascidos sem certidão de nascimento e sem a devida imunização nas prisões, a presidente do CNJ determinou a imediata regularização dos documentos dos bebês e das vacinas necessárias. Em algumas prisões, a equipe do CNJ constatou que os bebês permanecem com as mães e crescem em ambientes separados das demais detentas.

Em outras unidades prisionais, esses recém-nascidos passam o dia em berçários aos cuidados de terceiros e são levados para as mães à noite para dormir em celas. Em outro exemplo, o CNJ encontrou no Centro de Ressocialização Suely Maria Mendonça, em Rondônia, um espaço recém-inaugurado reservado aos berçários.

Só que na época não havia bebês no estabelecimento. O berçário, no entanto, possui as portas de ferro das celas originais para abrigar bebês, que evidentemente não possuem relação com crimes e contravenções.

“Vamos elaborar diretrizes para assegurar um fluxo padronizado para o atendimento das grávidas, lactantes e seus filhos”, disse Andremara dos Santos ao frisar a importância de um tratamento uniforme também para os bebês, a começar pela obrigatoriedade do registro de nascimento e cuidados básicos de saúde.

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A magistrada chama a atenção também para a necessidade da presença de um juiz da Vara da Infância e Juventude nos estabelecimentos penais em que houver filhos de presas. Isso porque, lembra Andremara dos Santos, os bebês ou crianças não têm qualquer relação com crimes e não devem, por isso, estar sob a responsabilidade das varas de execução penal.

 Recomendações

As informações coletadas nos 33 estabelecimentos penais de 26 unidades da Federação permitirão ao CNJ elaborar um protocolo de recomendações a ser adotado pelos estabelecimentos penais em relação aos serviços de saúde e cuidados específicos às presas grávidas e lactantes.

A finalidade é padronizar as instruções de forma que as prisões tenham uma atuação uniforme em relação a essas mulheres. A uniformização abrangerá, também, cuidados com os filhos das presas.

Entre as recomendações a serem feitas constam a realização de pré-natal, infraestrutura mínima para a saúde da mulher, cuidados com a saúde dos bebês de presas nos cárceres, obrigatoriedade do registro dos filhos de grávidas em estabelecimentos penais e a exigência da presença de um juiz da Vara da Infância e da Juventude nas unidades prisionais que estiverem abrigando bebês de detentas.

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