Poucos cliques evitariam a contratação de falsos médicos

O culpado pela decisão errada foi um falso profissional da medicina que atuava como funcionário terceirizado de uma concessionária que presta primeiros socorros na Via Dutra

Alexandre Pegoraro
Publicada em 12 de abril de 2022 às 10:09
Poucos cliques evitariam a contratação de falsos médicos

Não bastasse ter se envolvido em um engavetamento com a participação de três caminhões a 230 km da capital paulista, que o deixou com as pernas presas nas ferragens, um motorista de 36 anos ainda foi vítima de um problema estrutural na saúde brasileira cuja existência chega a ser constrangedora, na era da transformação digital, que é a ação de falsos médicos. O fato ocorrido no dia 13 de março resultou na amputação de uma das pernas do trabalhador de forma totalmente desnecessária. 

O culpado pela decisão errada foi um falso profissional da medicina que atuava como funcionário terceirizado de uma concessionária que presta primeiros socorros na Via Dutra. Sua total falta de conhecimento e habilidade para realizar o procedimento chamou a atenção de policiais que, ao fazerem uma rápida pesquisa, descobriram que o personagem usava o CRM de outro profissional que já havia falecido. Aprofundando um pouco mais a busca, veio à tona o fato de que  este documento também permitiu ao falso doutor trabalhar em outros três lugares, sendo dois relacionados a prefeituras. Em um deles chegou a atender 18 pessoas, incluindo crianças e idosos. No outro, teve em suas mãos as vidas de três pacientes. 

O caso ganhou repercussão na grande imprensa e chama a atenção por dois aspectos: 

  1. Este tipo de fraude acontece com uma frequência assustadora
  2. Não existe razão para isso continuar acontecendo.

Para chegar a esta segunda conclusão, basta ver o que ocorre quando se toma um mínimo de cuidado com a verificação da identidade na contratação destes profissionais.  Um exemplo ocorreu também no mês de março, quando o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) impediu que três indivíduos com documentos falsos conseguissem obter o registro no órgão para atuar no Estado. 

Como isso foi possível ? 

Ao notarem que a solicitação foi feita com base em  diplomas expedidos pela Universidade Gama Filho (Rio de Janeiro), com data de formatura em 13 de janeiro de 2006, os avaliadores do CRM suspeitaram da ação. Isto porque se a informação fosse verdadeira, significaria que eles haviam ficado 16 anos sem solicitar o registro para exercer a profissão. Além disso, eles estavam citando uma universidade, a Gama Filho, que já havia sido fechada, sendo absorvida pela Faculdade Estácio de Sá.

O próximo passo foi fazer contato com a Faculdade Estácio de Sá, que informou não ter localizado registro desses três alunos no sistema da instituição. Confirmando que os diplomas eram falsos, ou seja, os indivíduos não tinham formação de médico, o Cremeb encaminhou a fraude à Polícia Federal para apurar os fatos.

Se apenas a ação atenta de funcionários do  Cremeb usando metodologias convencionais, como o telefone, já foi suficiente para coibir os fraudadores e proteger vidas, é fácil supor que automatizar este tipo de ‘investigação’ com a ajuda das mais modernas tecnologias pode minimizar e até zerar a presença destes charlatões nos ambientes de atendimento à saúde do país.

Legaltechs de tecnologia ligadas a compliance judicial disponibilizam a baixos custos a possibilidade de fazer pesquisas por meio de  mineração de dados através de mais de 3.500 fontes, nacionais e internacionais, realizando análises, a partir de Inteligência Artificial para verificação de processos, vestígios de corrupção, lavagem de dinheiro, terrorismo, leis ambientais, crédito e mídia negativa, entregando esse resultado para os clientes em menos de 1 minuto. 

No final de toda esta investigação, feita a partir de apenas poucos cliques, os dossiês apontam com  precisão o envolvimento de pessoas e empresas em casos de fraudes dos mais diversos tipos.  Não seria difícil adaptar esta infraestrutura para detectar  falsários que utilizam documento de outro médico ou diploma falso; ou aqueles que se formaram no exterior, mas não fizeram o revalida; assim como o profissional de outra área da saúde e que exerce atividade exclusiva de médico e outras variedades de golpes. 

Tendo em mãos este tipo de ferramenta, por que não obrigar os contratantes de mão de obra profissional da saúde a submeter os nomes dos candidatos às suas vagas a este tipo de apuração?

Ao fazer desta forma, a proteção não seria apenas para os pacientes dessas empresas, mas também para a saúde financeira delas próprias. Só para ter uma ideia, em dezembro do ano passado, o promotor de Justiça Marlon Fernandes, na 3ª Vara Cível de Praia Grande, condenou três empresas a pagarem R$ 500 mil de indenização por dano moral social ao Estado devido à contratação de um falso médico para trabalhar em uma unidade de saúde.

* Alexandre Pegoraro é CEO e fundador do Kronoos  

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