Desejos carnais - Capítulo 3
“Nada façais por contenta ou vanglória, mas por humildade; cada um considere os outros superiores a si mesmo”
(Filipenses 2: 3 - Almeida Revista e Corrigida, 1911)
Geralmente, as expectativas masculinas estão focadas em êxitos profissionais, financeiros. “É preciso alcançar o pódio!” Tal pensamento motiva os homens que desejam mais na vida. Alguns, movidos pela ambição exacerbada, se perdem, se corrompem na jornada, pois a ética, em diversos momentos, se fragiliza diante de tantas propostas tentadoras e rentáveis. “É só uma gambiarra, cara. Deixa de ser careta! Qual o problema de infringir as leis só um pouquinho? Não faz mal. Relaxa! Ou tá querendo ser santinho?”
Quando Julian colocou em cima da mesa de vidro a mala cinza, média e imponente, Dom o olhou com desconfiança. Franziu a testa. No fundo, já sabia que toda aquela atmosfera revelava o que havia por trás de tanto mistério. Corrupção! Falcatruas! “Esse cara tá metido com coisa errada.”
— O que significa isso? — questionou ele já cruzando os braços. Mordeu os lábios enquanto analisava minuciosamente o outro homem.
Julian tirou os óculos escuros revelando um olhar esperto, maldoso. Respondeu com um sorriso cínico:
— Calma! Calma! É só confiar em mim. Só na tranquilidade!
Deu uma leve risada e continuou com uma entonação vocal oscilante:
— Sabe, né?! Tipo… O homem precisa se garantir na vida. Afinal, o jogo é sujo e de qualquer maneira a gente vai se sujar. Então… sabe? O Vicente vai ligar! Agora ele tá resolvendo algumas questões pessoais, mas ele vai entrar em contato.
— Sente-se — pediu Dom apontando para a cadeira. A sagacidade presente naquele homem aparentemente inofensivo. — Ou tá com muita pressa?
— Jamais! Jamais, patrão!
Agilmente, Julian acomodou-se à mesa e foi logo enviando uma mensagem para Vicente no seu iPhone. “Esse cara não vai me enrolar”, pensou Dom enquanto ajeitava a gola da camisa social comprada em Amsterdam em uma viagem de férias. “O Vicente tá é armando pra mim. Com certeza! Questões pessoais? É. Os casos deles são questões pessoais mesmo. Canalha!”
Então, ambos se encontravam sentados à mesa. Homens com olhos vívidos.
— Não exercer a hipocrisia é um belo princípio dos nobres! — afirmou Dom com uma seriedade filosófica quase sacra. — No entanto, nem todos os seres humanos a ignoram. Muitos até se inclinam diante dela. A hipocrisia não é uma religião! Não. A hipocrisia é a perdição dos vils!
— Nossa! Quanta austeridade!
— Exatamente!
Julian riu com um leve deboche. Comentou:
— Sendo sincero, eu não acredito na ética que os idealistas tanto defendem. Eu vim do gueto! Eu vim da miséria! Como é que eu vou ficar acreditando em fábulas se a realidade da vida é outra?
— Qual a realidade da vida pra você?
— É preciso ter money pra ser alguém na sociedade! Money. Você sabe. Tá na cara de todo mundo. Mas o povo finge não ver o que tá tão explícito.
— Entendi. Então… é por esse motivo que você se sujeita a fazer o que não deve?
— Eu preciso me virar, Dom.
— Existem outros tipos de trabalho.
— Grana mesmo, Dom… só nesses rolos do Vicente. Eu sei que parece maldoso. Mas se a bandidagem tá aí e não vai acabar, por que eu vou me sentir culpado? Hein? Grana é grana!
— Não.
Os dois ficaram em silêncio. Na expressão facial de Julian, a vergonha dos marginais que flertam com a honestidade, mas não se deixam ser envolvidos completamente por ela.
— Ele mente — disse Dom. — Ele mente demais e ainda faz a gente acreditar que… é assim mesmo. Que é preciso jogar pra matar ou matar.
— Eu sei!
— Sabe. Sabe mesmo. Mas não quer sair da sujeira.
— E você quer? — indagou Julian com os olhos altivos. — Falar no seu lugar é fácil. Quem vai olhar pra mim com carinho? Com consideração, hein? Eu também sei o valor do amor, da amizade. Mas eu tô sozinho nesse barco. Entendeu? Não dá pra ficar romantizando a vida. Você não sabe o que é vim do gueto! Então para de me julgar, seu Mauricinho. Você não sabe o que eu já vivi. Não vem dar pitaco na minha vida.
Dom, sentindo-se envergonhado, abaixou o olhar em um sinal de remorso e humildade. Confessou:
— Você tá falando a verdade. Eu me deixei envolver por toda essa loucura e… olha pra mim, Julian. Eu tô sem moral! Na verdade, eu nem sei mais quem eu sou. Com o tempo, Julian, a gente corre o risco de não se reconhecer em frente ao espelho. Tantos erros, dificuldades, vícios, mentiras, estratégias questionáveis e… a maioria das pessoas nem ligam pro que a gente sente. Pro que a gente guarda. Seja amor ou rancor. Às vezes o que sobra não vale a pena. Mas é uma sobra que a gente se agarra mesmo sabendo que não pode se apegar ao que é nocivo. Mas… o que fazer, hein? O que fazer? Como você mesmo disse agora pouco…. o palpite sem a noção da realidade vira uma afronta. Uma afronta pros escarnecidos!
— Cara, eu não sabia que você tava assim.
— O problema é na alma, Julian. Na alma.
— Por isso você foi na igreja, né?!
— É. Pra buscar refúgio, alívio, paz. Mas tá difícil. A culpa. O medo. O desejo de ir pra outro país. Só que… pra quê, Julian? Pra fugir do que me atormenta dia e noite? Não dá. Não tem como. E pra ser muito realista… até demais. Eu tenho até vontade de me suicidar.
Julian assustou-se. Ele disse:
— Não, cara. Não faz isso!
Ao ouvir essas palavras de motivação vindas de Julian, Dom levantou o olhar abatido e o fitou por alguns segundos.
— O que foi?
De repente, Dom mudou o olhar. A expressão facial dele revelou um homem maldoso, calculista.
— Se eu acabar com essa tua vida escrota ninguém vai desconfiar de mim, seu lixo!
O coração de Julian acelerou. A decepção o tomou.
— Sabia. Esse papo de Deus, religião… tudo mentira sua pra despistar o povo. Hein? Você não presta mesmo. E o Vicente já tinha me dito isso. Mas eu não acreditei.
— O Vicente falou isso? Poxa! Grande traíra o Vicente! E é mesmo. Eu não presto! Já prestei. Mas entendi o jogo. E eu não tô a fim de perder essa parada.
— Eu não tenho medo de você, Dom!
— Nem eu tenho medo dos teus músculos. Aliás, músculos que já foram lambidos por vários gays. Tô mentindo? Inclusive o Vicente já se lambuzou demais nesse corpo musculoso e queimado do Sol. Sinceramente, Julian! Ser sustentado pelo Pink Money não fica legal prum cara que quer meter medo nos outros. Como fica a moral, hein?
— Você tá sendo homofóbico!
— É? E eu tô mentindo? O Vicente inventa pra mídia que é hétero. Você é um homem rústico, mas na cama faz tudo conforme a negociação com os gays. Tô mentindo, gigolô? Não. Claro que não! Ativo, passivo ou versátil? Tudo. O Julian faz os três papéis conforme o money. Bandido e homossexual! Grande enredo de uma série badalada e polêmica!
— Eu sou mais macho do que você, enganador! Claro que você não ia se converter tão fácil assim! Os milionários geralmente não seguem Jesus Cristo verdadeiramente.
— E quem disse que você pode falar de Jesus Cristo? Nem Ele te quer, seu lixo.
Sentindo-se irado, Julian levantou-se da cadeira gritando a seguinte frase com vontade:
— Cala a boca, desgraçado! Eu não tenho medo de um mortal. Cala a boca, covarde!
Com um riso cínico, Dom também levantou-se da cadeira e estufou o tórax ao encarar o capanga.
— Verdade! Eu menti. Eu não sou não um cristão autêntico. E eu não nem pretendo ser.
— Assim você vai morrer.
Dom riu.
— Será? Dúvido! Eu tenho grana!
— E pensar que o Vicente é que passa por vilão. Você é dez mil vezes pior do que ele. E escuta… ter grana não te livra da morte.
— Eu compro a vida.
Julian riu com deboche. Afirmou:
— Você não compra nem o amor de uma mulher. Quanto mais a vida. Te manca, cara!
Dom perguntou:
— Perdeu o medo de se arrepender pra sempre?
E então, movido pela impulsividade, Julian deu um murro violento em Dom fazendo-o perder na hora um dente da frente. Gritou:
— Maldito! Maldito!
“Porque, se alguém cuida ser alguma coisa, não sendo nada, engana-se a si mesmo.”
(Gálatas 6:3 - Almeida Revista e Corrigida, 1911)
Tomou mais um gole de vinho. Ele disse:
— Eu tô de volta ao submundo.
Ele quem? Dom. Dom e sua recaída no mundo das práticas pecaminosas. Continuou:
— Mas a culpa é sua também, Vicente! A culpa não é só minha.
Vicente estava sentado com as pernas cruzadas na poltrona de couro. Segurava sensualmente o cigarro aceso. Riu. Comentou:
— Não seja tão sádico! Nem é só porque eu sou gay que mereço levar a culpa de tudo. Reconheça seus delitos pessoais e busque se recompor.
Dom o olhou com escárnio.
— Eu não sou um vilão.
— De novo essa conversa, querido? Para! Chega! Tá chato! Eu sei, eu sei que você flerta com o Evangelho de Jesus Cristo, mas não se deixe levar por fantasias disseminadas por líderes religiosos.
— Eu quero mudar — confessou Dom enquanto enchia lentamente a taça de mais vinho. — Acontece que os prazeres da carne são vários e o meu espírito tá fraco. Eu tô mundano!
Vicente gargalhou. O olhar maligno. Argumentou:
— Todos nós somos mundanos. Todos nós somos sedentos das águas da sensualidade. Eis a essência adâmica! Não há um porquê pra tanto pessimismo. Não floreie o que aparentemente é feio. O que importa é o gozo terreno! Se há gozo terreno, há alegria pra natureza adâmica.
— Você não me entende, Vicente. Eu tô tentando mudar. Eu tô tentando reescrever a minha história. Mas a cada passo que eu dou, você vem e interfere no meu processo. Você me odeia! Você me joga pros vícios novamente.
— Eu? Jamais! Eu sou a voz da razão. A voz cosmopolita. Não a voz da religiosidade exacerbada. Pense. Crie. Viaje. Contemple as alegrias deste mundo. O que há no além? Nada. O Julian, infelizmente, resolveu ir à igreja e largar a criminalidade. Igual você na sua fase gospel. Mas você despertou. Você se revelou contra o sistema hipócrita dos pastores. Agora sim eu voltei a te reconhecer. Agora sim eu posso ver e me deleitar com as garras afiadas de um homem irreligioso e admirável. Eu te admiro demais! Continue assim! Não se coloque à disposição do Evangelho de Jesus Cristo. Seja livre!
Alberto Dinys é um escritor cristão, 25 anos, que tem um belíssimo ministério pastoral por meio da literatura cristã contemporânea. “Escrever sobre Deus é pregar além da igreja institucionalizada. É chegar em pessoas que não vão aos cultos evangélicos, mas que sentem a necessidade de conhecer A Palavra de Deus. É uma missão belíssima! E o Senhor vem me moldando a cada dia. Com Ele me torno melhor. Vou deixando a vaidade para trás e me vivifico por meio do Seu poder.”, diz Alberto Dinys.
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