Por que a Globo não mostra ação da PF em Curitiba
O silêncio da Globo não é neutro. É escolha. E toda escolha revela lado
Moro ladeado por João Roberto Marinho e Ascânio Seleme (Foto: Reprodução/Globo)
A operação da Polícia Federal na 13ª Vara Federal de Curitiba, nesta quarta 3, escancarou um silêncio que diz muito sobre o jornalismo brasileiro. A TV Globo não dedicou um único minuto à busca e apreensão determinada pelo ministro Dias Toffoli no antigo templo da Lava Jato, que apura acusações gravíssimas feitas por Tony Garcia contra o então juiz Sergio Moro, hoje senador e pré-candidato ao governo do Paraná pelo União Brasil. A afiliada local, RPC, repercutiu o caso, mas os telejornais nacionais trataram como nota morta, e a GloboNews, sempre ansiosa por repetir uma notícia até a exaustão, fingiu que nada aconteceu.
O contraste é brutal. Nos anos de ouro da Lava Jato, entre 2014 e 2021, cada movimento de Moro ganhava abertura de telejornal já na “escalada” [aquelas micromanchetes no início]. Ordens de prisão viravam espetáculo. Vazamentos seletivos, muitas vezes ilegais, eram tratados como provas. A emissora operava como caixa de ressonância da força-tarefa, a ponto de transformar delações em novelas jurídicas e encerrar reportagens com o tom quase reverencial de “se o juiz espirrar, saúde”. Hoje, quando a PF entra justamente na sala que abrigou esse culto midiático, a Globo não mostra.
Há razões para isso. A operação desta quarta mexe na estrutura narrativa construída pela emissora ao longo de uma década. Tony Garcia descreve um sistema de espionagem ilegal, grampo clandestino, chantagens, manipulação de processos, uso político do Judiciário e um arsenal de provas guardado em uma “caixa amarela”, que poderia revelar vícios profundos da Lava Jato e de seus protagonistas. Exibir essa operação com destaque significaria reconhecer que a Globo ajudou a legitimar, durante anos, o que agora aparece como um projeto de poder baseado em abusos.
O silêncio também revela temor reputacional. Se a investigação caminhar, a emissora pode ser cobrada por ter encampado uma narrativa sem contraditório, ignorando críticas, reforçando versões unilaterais e projetando Moro como herói nacional. Daí a escolha editorial: tratar o assunto como nota de rodapé, deixar a RPC falar sozinha e evitar que milhões de brasileiros vejam a cena simbólica da PF entrando no bunker da Lava Jato.
Outro elemento pesa. A Lava Jato foi a responsável pelo clima antipolítico, embora seus integrantes mirassem o poder para si mesmos. Interferiu em eleições, destruiu carreiras, derrubou governos e criou uma geração de “paladinos” que surfaram a onda moralista para chegar ao poder. Questionar esse passado, agora que Moro disputa o governo do Paraná e tenta reconstruir sua imagem, seria abrir uma rachadura interna na própria narrativa jornalística que a Globo ajudou a erguer.
Nada disso, porém, explica por que a GloboNews, que vive de breaking news, ignorou a ação. O canal vibra com operações muito menores. Mas quando o alvo está dentro da casa que ela própria ajudou a santificar, o apetite desaparece. Não se trata de prudência, mas de seletividade. A emissora cobre quando quer, e silencia quando não pode arcar com o custo político da cobertura.
Tony Garcia revelou ao Blog do Esmael o modus operandi que abasteceu os jornalões da velha mídia, inclusive a Globo, num esquema tão absurdo que até Deus duvida. Por isso a emissora não mostra a operação da PF em Curitiba.
A pergunta inevitável é: quem ganha com a censura? Certamente não o público, que tem direito à informação completa sobre um inquérito que pode alterar o cenário eleitoral do Paraná e do país. Tampouco o jornalismo, que perde credibilidade ao fugir da notícia mais relevante do dia. Quem ganha, no fim, é o projeto político que a Lava Jato forjou, e que segue vivo, ainda que em estado terminal, no imaginário de parte do eleitorado.
O silêncio da Globo não é neutro. É escolha. E toda escolha revela lado.
Continue acompanhando os bastidores da política e do poder pelo Blog do Esmael.
Esmael Morais
Jornalista e blogueiro paranaense, Esmael Morais é responsável pelo Blog do Esmael, um dos sites políticos mais acessados do seu estado
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