Compromisso democrático

A lembrança remete à necessidade de deixar estabelecido que a OAB não pode se furtar a seu compromisso histórico em defesa da democracia, da constituição e das leis

Fonte: Andrey Cavalcante - Publicada em 28 de julho de 2025 às 14:48

Compromisso democrático

Não é meramente honorífico, ao contrário do que possam crer alguns, o título de Membro Honorário Vitalício da OAB, que orgulhosamente ostento, pela honra de ter ocupado a Presidência da OAB por dois mandatos, que foram concedidos pela generosidade e confiança da advocacia rondoniense. Cabe, contudo a nós, membro desse seleto grupo de ex-presidentes, a responsabilidade de usar nossa experiência de forma a contribuir para que dúvidas sejam dirimidas e rumos reorientados. E que sejam evitados os caminhos fáceis e via de regra equivocados das soluções simples e no geral simplórias para questões complexas.

Não por acaso substitui o título original deste artigo - “O Papel da OAB no Estado Democrático de Direito” – pelo que publiquei em 03/11/2017 – no qual aplaudi a escolha do nome do ex-presidente da OAB, Raymundo Faoro, como patrono da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Foi, afinal, durante a VII Conferência Nacional da OAB, em 1978, que Faoro recebeu, do senador Petrônio Portela, então Ministro da Justiça, e do ministro do STF, Rafael Mayer, comunicado do general Ernesto Geisel.

O general confirmava sua intenção de autorizar a restauração do Habeas Corpus e decretar a Lei de Anistia, como pedia a OAB. Uma reverência a quem, embora em luta permanente pelo fim dos Atos Institucionais, pela anistia e pela redemocratização do país, era o grande interlocutor da sociedade civil com o governo Geisel. A lembrança remete à necessidade de deixar estabelecido que a OAB não pode se furtar a seu compromisso histórico em defesa da democracia, da constituição e das leis.

Nem pode se permitir contaminar pela leitura apressada de Montesquieu, limitada exclusivamente na separação dos poderes. Não chega a virar a página para perceber a importância da harmonia entre eles, ou dos mecanismos de controle (de constitucionalidade, tarefa destinada ao STF pela Carta de 1988). A verdade é que em tempos de incerteza e polarização, é fundamental que a Ordem dos Advogados atue com firmeza, responsabilidade e equilíbrio. Não cabe, portanto, à OAB incendiar debates ou fomentar instabilidades em momentos críticos. Seu papel não é ser palco de paixões partidárias, mas sim de guardiã da legalidade, da ética e da cidadania.

Preservar a democracia exige prudência, diálogo e compromisso com os princípios que sustentam uma sociedade justa. A atuação da OAB deve buscar o equilíbrio: denunciar abusos e omissões, sim, mas sem se tornar instrumento de disputas político-eleitorais. É necessário discernimento para compreender quando a crítica é legítima e quando ela passa a alimentar narrativas irresponsáveis que colocam em risco as instituições. A verdadeira coragem institucional está em sustentar o Estado de Direito mesmo quando pressões externas tentam desvirtuá-lo.

Em discurso proferido na solenidade comemorativa dos 50 anos da OAB Rondônia, afirmei que o amor incondicional, generoso, altruísta e infinito à nossa profissão e à instituição que nos congrega e nos une, igualmente nos sentencia a uma grave responsabilidade. Disse que, na primorosa definição do jurista e professor Pedro Serrano, os direitos não foram conquistados com longos e belos textos assentados em papel luxuoso. Ao contrário, foram conquistados por décadas de lutas. À custa de muita dor e sofrimento. “Aqueles heróis nos entregaram esse tesouro: a cidadania, o direito a ter direitos”.

Edmund Burke, filósofo conservador – convém destacar – complementa o raciocínio: - “O direito não é conquista de uma geração. Não pode ser uma decisão firmada só entre os vivos. É um legado de gerações passadas, que nos foi entregue com o compromisso de passá-lo às gerações futuras”. O que somente é possível na democracia, dentro do estado democrático de direito e do absoluto respeito à constituição.

*Andrey Cavalcante é ex-presidente e membro honorário vitalício da OAB Rondônia

Compromisso democrático

A lembrança remete à necessidade de deixar estabelecido que a OAB não pode se furtar a seu compromisso histórico em defesa da democracia, da constituição e das leis

Andrey Cavalcante
Publicada em 28 de julho de 2025 às 14:48
Compromisso democrático

Não é meramente honorífico, ao contrário do que possam crer alguns, o título de Membro Honorário Vitalício da OAB, que orgulhosamente ostento, pela honra de ter ocupado a Presidência da OAB por dois mandatos, que foram concedidos pela generosidade e confiança da advocacia rondoniense. Cabe, contudo a nós, membro desse seleto grupo de ex-presidentes, a responsabilidade de usar nossa experiência de forma a contribuir para que dúvidas sejam dirimidas e rumos reorientados. E que sejam evitados os caminhos fáceis e via de regra equivocados das soluções simples e no geral simplórias para questões complexas.

Não por acaso substitui o título original deste artigo - “O Papel da OAB no Estado Democrático de Direito” – pelo que publiquei em 03/11/2017 – no qual aplaudi a escolha do nome do ex-presidente da OAB, Raymundo Faoro, como patrono da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Foi, afinal, durante a VII Conferência Nacional da OAB, em 1978, que Faoro recebeu, do senador Petrônio Portela, então Ministro da Justiça, e do ministro do STF, Rafael Mayer, comunicado do general Ernesto Geisel.

O general confirmava sua intenção de autorizar a restauração do Habeas Corpus e decretar a Lei de Anistia, como pedia a OAB. Uma reverência a quem, embora em luta permanente pelo fim dos Atos Institucionais, pela anistia e pela redemocratização do país, era o grande interlocutor da sociedade civil com o governo Geisel. A lembrança remete à necessidade de deixar estabelecido que a OAB não pode se furtar a seu compromisso histórico em defesa da democracia, da constituição e das leis.

Nem pode se permitir contaminar pela leitura apressada de Montesquieu, limitada exclusivamente na separação dos poderes. Não chega a virar a página para perceber a importância da harmonia entre eles, ou dos mecanismos de controle (de constitucionalidade, tarefa destinada ao STF pela Carta de 1988). A verdade é que em tempos de incerteza e polarização, é fundamental que a Ordem dos Advogados atue com firmeza, responsabilidade e equilíbrio. Não cabe, portanto, à OAB incendiar debates ou fomentar instabilidades em momentos críticos. Seu papel não é ser palco de paixões partidárias, mas sim de guardiã da legalidade, da ética e da cidadania.

Preservar a democracia exige prudência, diálogo e compromisso com os princípios que sustentam uma sociedade justa. A atuação da OAB deve buscar o equilíbrio: denunciar abusos e omissões, sim, mas sem se tornar instrumento de disputas político-eleitorais. É necessário discernimento para compreender quando a crítica é legítima e quando ela passa a alimentar narrativas irresponsáveis que colocam em risco as instituições. A verdadeira coragem institucional está em sustentar o Estado de Direito mesmo quando pressões externas tentam desvirtuá-lo.

Em discurso proferido na solenidade comemorativa dos 50 anos da OAB Rondônia, afirmei que o amor incondicional, generoso, altruísta e infinito à nossa profissão e à instituição que nos congrega e nos une, igualmente nos sentencia a uma grave responsabilidade. Disse que, na primorosa definição do jurista e professor Pedro Serrano, os direitos não foram conquistados com longos e belos textos assentados em papel luxuoso. Ao contrário, foram conquistados por décadas de lutas. À custa de muita dor e sofrimento. “Aqueles heróis nos entregaram esse tesouro: a cidadania, o direito a ter direitos”.

Edmund Burke, filósofo conservador – convém destacar – complementa o raciocínio: - “O direito não é conquista de uma geração. Não pode ser uma decisão firmada só entre os vivos. É um legado de gerações passadas, que nos foi entregue com o compromisso de passá-lo às gerações futuras”. O que somente é possível na democracia, dentro do estado democrático de direito e do absoluto respeito à constituição.

*Andrey Cavalcante é ex-presidente e membro honorário vitalício da OAB Rondônia

Comentários

  • 1
    image
    edgard alves feitosa 29/07/2025

    Lembrando Bertolt Brecht: "INFELIZ DA NAÇÃO QUE PRECISA DE HERÓIS".....Tudo para que não se caia na 'TENTAÇÃO que, infelizmente, tomou conta do Brasil, em que o "herói Alexandre de Moraes" é o "herói da pátria"...é o "herói da democracia"...A DEMOCRACIA não pode estar ancorada em um ou nos Ministros do STF, pois todos passam e serão substituídos.....mas sim na CONSTITUIÇÃO CIDADÃ, nossa TÁBUAS DA LEI....O STF está e vai continuar condenando todos que participaram do 8 de janeiro....O Estado Democrático de Direito pressupõe que exista uma Instância em que se possa recorrer de uma Sentença...Com as sentenças de Moraes, recorrer a QUEM???? AO PRÓPRIO MORAES??? ESTAMOS DIANTE DE UM TRIBUNAL DE EXCEÇÃO ONDE NÃO HÁ A QUEM RECORRER....O Ministro Moraes encarnou o espírito de Torquemada.....está tão acima da Constituição que chegou ao ponto de PROIBIR MANIFESTAÇÕES NA PRAÇA DOS TRES PODERES, DA MESMA FORMA COMO O GOVERNO COMUNISTA DA CHINA FEZ NA PRAÇA CELESTIAL.....CESSE TUDO O QUE A CONSTITUIÇÃO CANTA, POIS OUTRO VALOR MAIS ALTO SE LEVANTA....

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