Porto Velho: a favela interior

Porto Velho é uma enorme favela a céu aberto, sem qualidade de vida e cheia de problemas

Professor Nazareno
Publicada em 27 de março de 2023 às 14:38

Certa vez um mestre bastante conhecido, meu amigo de longa data e um excelente professor de História, disse-me que o conceito de favela, como nos ensinaram, poderia estar errado. Favela, disse ele, não é o lugar físico, mas a cabeça das pessoas que ali moram. E concluiu: se pudéssemos trocar as populações inteiras de duas cidades qualquer, depois de um certo tempo, comprovaríamos na prática o que eu estou dizendo. Como experiência, sugeri trocar as populações de duas cidades modernas: Porto Velho no Brasil e Frankfurt na Alemanha. Segundo esse raciocínio, depois de uns dez anos e com um outro povo, o lugar físico onde está a capital de Rondônia se transformaria em uma cidade moderna, arrojada, arborizada, limpa, urbanizada e com excelente qualidade de vida. Já a cidade alemã viraria uma grande favela com as mesmas características daqui.

Conheço as duas cidades e tenho a certeza de que não se pode comparar em absolutamente nada os dois lugares. Porto Velho é uma enorme favela a céu aberto, sem qualidade de vida e cheia de problemas. Frankfurt é moderna, tem boa mobilidade urbana, quase não tem violência, muito arborizada, asseada e é sede das principais instituições financeiras da Europa e do mundo. Com populações um pouco acima de meio milhão de habitantes, as duas cidades em nada se parecem. Uma é fria e aconchegante, a outra é quente como um forno. O aeroporto de Frankfurt é o segundo maior da União Europeia. Porto Velho sequer tem aeroporto. O sistema de metrô dos alemães é de fazer inveja a qualquer pessoa. A Hauptbahnhof ou estação central é um brinco de tão limpa. Os trens ali são pontuais, limpos, rápidos e bem seguros. Aqui, sequer temos transportes coletivos.

O que fariam os porto-velhenses se fossem morar em Frankfurt de uma hora para outra? O rio Main (Meno), que corta a cidade, tem hoje água potável. Atrasados como são e desacostumados com o saneamento básico e água tratada, muitos rondonienses logo cavariam fossas e canalizariam os esgotos para o rio como já fazem por aqui. Mulheres com latas de água na cabeça seria uma triste rotina. Alguns comerciantes comprariam dragas e balsas para buscar ouro no Main. Em pouco tempo o mercúrio contaminaria aquele rio. Poços seriam cavados ao lado de fossas imundas para poder abastecer os moradores. Nos vasos sanitários seriam plantados pés de cheiro-verde para temperar a comida. Casas, só com muro. Para melhorar a mobilidade urbana, criava-se o sistema de mototáxi, táxis clandestinos e alternativos. E como seria a rodoviária com os Karipunas?

Já com os alemães morando às margens do rio Madeira a coisa seria bem diferente: o prefeito da cidade teria outro nome bem mais bonito: Gerhard Fritz ou Olaf Schröder. Nada de Mauro Nazif ou Hildon Chaves. A Câmara de Vereadores não teria nenhum vereador comprado e haveria oposição de verdade ao alcaide. Os impostos seriam justos e com a contrapartida necessária. Mobilidade urbana e talvez até metrô em pouco tempo. A mídia local não seria comprada e também não receberia nada de dinheiro para adular as autoridades. Tudo certinho funcionando como numa democracia de verdade. Já pensou um aeroporto com voos para Rio Branco, Manaus, Brasília, Rio e São Paulo duas ou três vezes ao dia? Várias universidades públicas com muitos cursos. As escolas, todas elas públicas, seriam como foi a Escola João Bento da Costa em tempos passados. Segurança, civilidade, organização. Enquanto isso, se teria pena da Frankfurt dos rondonienses. Será?

*Foi Professor em Porto Velho.

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